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Foto do escritorFabiana Lima

Baby - 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo

Influência estética inegável do cinema contemporâneo, provavelmente os filmes de Wong Kar-wai inspiraram a todos os cineastas que uma vez tiveram o prazer de assisti-lo. Suas luzes neons, jogos de espelhos, relacionamentos complicados e trilhas sonoras inconfundíveis imprimem uma marca que ressoa no coração de todos os cinéfilos - e muitos realizadores de cinema. Para Marcelo Caetano, “Baby” parece ser um dos casos. 



Em uma espécie de “Felizes Juntos” (1997), o longa brasileiro transporta o romance “Wong Kar-wainiano” das ruas noturnas da Argentina para a caoticidade e a solidão da grande São Paulo. Através dos espaços sempre bagunçados e precários, o relacionamento de dois homens em momentos bastante diferentes da vida é cheio de toxicidade e, ao mesmo tempo, imenso afeto marcado por constantes idas e vindas e um pé na vida marginalizada - da mesma forma que Lai e Ho em Buenos Aires.


Baby (João Mariano) tem dezoito anos e acabou de sair da Fundação Casa. Ao tentar o retorno para sua casa, descobre que seus pais o abandonaram e foram embora de São Paulo. Em pouco tempo, o protagonista está entregue à própria sorte, dormindo nos bancos das estações de metrô, perambulando na madrugada por casas de prostituição e casas de homens mais velhos que estão dispostos a bancá-lo de alguma forma. Em todas essas situações, a constante na imagem são os jogos de espelhos e as cores almodovarianas dos ambientes, os quais refletem o fogo das paixões efêmeras e, também, a solidão do coração daqueles que estão tão perdidos quanto Baby na grande metrópole. 


Marcada para sempre pela homofobia que sofreu durante a infância e a adolescência, a vida do personagem interpretado por João Mariano é de um pesar imenso. Seu corpo imprime a fragilidade, a inocência e também a força de um personagem muito complexo, com uma inocência infantil ainda presente, mas com uma cobrança ainda maior de agir como “gente grande” - “para de ser baby.” Enquanto isso, Ricardo Teodoro atinge o mesmo nível de complexidade ao interpretar Ronaldo, um garoto de programa e “aviãozinho” aos 42 anos, lutando para que o filho de treze tenha o básico para se manter num país de tantas desigualdades sociais. Duas grandes atuações que se combinam em equilíbrio total, com uma química atravessando a tela. 



O filme decide encerrar com uma sequência de ambos se reencontrando depois de meses em um ônibus, na qual Ronaldo reconhece Baby performando com seus amigos para tentar garantir a refeição do dia. Durante a conversa emocionante dos dois, a cidade que não dorme passa atrás como um borrão, retrato de uma história de passagens, e então o diretor nos leva de volta ao momento de ambos a sós, com suas risadas e movimentos de vogue que se confundem com o boxe.


Como em “Bom Trabalho” (1999) de Claire Denis, os corpos coreografam danças que se fundem com lutas e vice-versa. É naquele momento que entendemos que, para a comunidade queer, expressar quem você é sempre será sinônimo de lutar. Para Baby, é. “Não vai desaparecer”, diz Ronaldo, mas Baby desce no próximo ponto e o pequeno recorte temporal de sua vida que acompanhamos até ali é eternizado em uma imagem que chega bem perto de quebrar a quarta parede, como se dissesse para nós, ao mesmo tempo que suplica por ajuda: “e agora, o que eu faço?”.


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